O calor intenso na Arábia Saudita durante a grande peregrinação muçulmana do Hajj resultou em um alto número de vítimas. Pelo menos 922 fiéis morreram no evento realizado na semana passada. Nesta quarta-feira (19), parentes de desaparecidos buscavam informações em hospitais, temendo o pior. No entanto, o governo local ainda não confirmou nenhuma morte relacionada às altas temperaturas.
“Todas as mortes recém-anunciadas são devidas ao calor,” afirmou um diplomata egípcio, mencionando 600 cidadãos entre as vítimas. Anteriormente, outros diplomatas relataram pelo menos 323 egípcios mortos no Hajj, indicando que os números estão em constante atualização e são difíceis de confirmar.
Além das mortes egípcias, diplomatas árabes relataram 60 óbitos entre jordanianos. Mortes também foram confirmadas entre cidadãos da Indonésia, Irã, Senegal, Tunísia e Curdistão iraquiano. Um diplomata asiático relatou “68 mortes” entre peregrinos indianos.
Pelo menos 550 corpos foram transportados para o necrotério de Al-Muaisem, um dos maiores de Meca.
No domingo (16), as autoridades sauditas informaram que mais de 2.000 peregrinos foram atendidos por estresse térmico, mas não forneceram detalhes sobre as mortes.
Oficialmente, o governo saudita não reconhece mortes ligadas ao calor extremo. As autoridades admitem apenas que milhares de peregrinos se sentiram mal devido às altas temperaturas. Na mídia oficial, o ministro da Saúde elogiou o atendimento dado aos afetados pelo calor.
O Hajj ocorreu de sexta-feira (14) a domingo (16), com temperaturas atingindo 51,8ºC na cidade sagrada de Meca.
Peregrinação Paralela
Todos os anos, dezenas de milhares de peregrinos tentam realizar o Hajj através de meios irregulares, pois não podem pagar pelas autorizações oficiais, que muitas vezes são caras.
Este foi o caso de Mabrouka bint Salem Shoushana, uma tunisiana desaparecida desde sábado. Sem registro oficial e autorização para o Hajj, ela não teve acesso às instalações climatizadas que permitiriam se refrescar após horas de orações ao ar livre, informou seu marido, Mohammed, à AFP. “Ela estava com tanto calor e não tinha onde dormir. Procurei-a em todos os hospitais e até agora não sei nada sobre ela,” lamenta.
Mohammed não é o único sem notícias. As redes sociais foram inundadas com fotos de pessoas desaparecidas e pedidos de informações.
Imagens mostram peregrinos deitados ao sol, cobertos por panos brancos. Eles foram aconselhados a usar sombrinhas e evitar o sol forte. As autoridades sauditas distribuíram água e gelo, mas isso não foi suficiente.
Como o Corpo Reage ao Calor Extremo?
O professor Bruno Megarbane, chefe da unidade de terapia intensiva do hospital Lariboisière, em Paris, explica os efeitos do calor extremo no corpo humano.
“O corpo humano deve manter uma temperatura constante, em torno de 37ºC. Quando a temperatura externa aumenta intensamente, o corpo precisa se adaptar para perder calor e manter sua temperatura interna constante,” explica. No entanto, “em algumas situações, essa adaptação falha, e a temperatura do corpo pode ultrapassar 40ºC, causando um pico de calor,” continua o especialista.
Se a temperatura interna ultrapassar 40ºC, pode haver consequências graves para o cérebro, como delírios, crises de epilepsia e até coma. Se a temperatura continuar a aumentar, o paciente pode sofrer perturbações cardiovasculares, num contexto de desidratação que pode levar à morte.
O Hajj e as Mudanças Climáticas
Um dos cinco pilares do Islã, o Hajj deve ser realizado pelo menos uma vez na vida de um muçulmano praticante que tenha condições financeiras. A peregrinação envolve uma série de ritos religiosos realizados durante vários dias na cidade sagrada e seus arredores.
As datas da peregrinação são determinadas pelo calendário lunar muçulmano, e os rituais têm ocorrido sob temperaturas cada vez mais altas nos últimos anos. A situação tem se agravado com o aquecimento global. Um estudo saudita publicado em maio alertou que as temperaturas nos locais dos rituais estão aumentando 0,4ºC a cada dez anos devido às mudanças climáticas.
Fonte: UOL
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