Depoimento ao STF revela contradições: Bolsonaro alegou economia, mas atacou sistematicamente a imprensa durante o mandato
Durante depoimento prestado nesta terça-feira (4) ao ministro Alexandre de Moraes, no Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou que os cortes de verba publicitária e outras ações contra a imprensa durante seu governo foram motivados por razões econômicas e respeito ao teto de gastos. No entanto, registros e declarações públicas de sua própria gestão contrariam essa narrativa, revelando um padrão de perseguição a veículos jornalísticos críticos, especialmente a Folha de S.Paulo.
A oitiva foi realizada no contexto da investigação sobre uma possível tentativa de golpe de Estado em 2022, da qual Bolsonaro é um dos principais alvos.
Bolsonaro alegou “ajuste orçamentário”, mas deixou rastro de retaliações
No depoimento, Bolsonaro declarou:
“Não é que eu cortei propaganda por maldade. É que eu tinha teto de gastos.”
Porém, ainda no primeiro ano de seu governo, o então presidente:
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Cancelou assinaturas de jornais como a Folha de S.Paulo para todos os órgãos do governo federal.
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Ameaçou cassar concessões de emissoras de TV.
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Desencorajou publicamente empresas a anunciarem em veículos que o criticavam.
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Insultou jornalistas em coletivas, lives e eventos oficiais, com ataques especialmente direcionados a mulheres repórteres.
Em diversas ocasiões, Bolsonaro deixou claro que o objetivo não era contenção de gastos, mas sim retaliação a críticas. Um exemplo emblemático foi sua fala em 2019:
“Eu não quero ler a Folha mais. E ponto final. E nenhum ministro meu. Recomendo a todo Brasil aqui que não compre o jornal Folha de S.Paulo.”
E ainda:
“Quem anuncia na Folha presta atenção, tá certo? Não vamos mais gastar dinheiro com esse tipo de jornal.”
Violação da Constituição e uso político da comunicação institucional
Ao usar o aparato do Estado para boicotar veículos de imprensa, Bolsonaro feriu os princípios constitucionais da moralidade, impessoalidade e legalidade, pilares da administração pública. As ações dele foram criticadas por juristas, entidades de imprensa e organizações internacionais de defesa da liberdade de expressão.
A Folha de S.Paulo, um dos principais alvos de Bolsonaro, respondeu às ameaças em nota:
“A Folha lamenta mais uma atitude abertamente discriminatória do presidente da República contra o jornal e vai seguir fazendo, em relação a seu governo, o jornalismo crítico e apartidário que a caracteriza.”
Depoimento enfraquece linha de defesa e reforça caráter persecutório
O depoimento de Bolsonaro ao STF foi mais uma tentativa de minimizar condutas deliberadas e sistemáticas contra a liberdade de imprensa. No entanto, declarações e ações documentadas ao longo de seu governo desmentem suas justificativas e fortalecem o entendimento de que houve, sim, uma política de retaliação e intimidação institucionalizada.
A tentativa de Jair Bolsonaro de justificar seus ataques à imprensa como uma medida de austeridade econômica não resiste à análise factual. Os registros mostram que sua gestão promoveu uma série de ações deliberadas para silenciar vozes críticas, ameaçando o equilíbrio democrático e desrespeitando direitos constitucionais.
O caso reforça o peso das investigações conduzidas pelo STF e a necessidade de apurar com rigor a instrumentalização do poder público para fins pessoais e políticos.