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Foto: TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO CONTEÚDO

Brasil

Internações involuntárias na Cracolândia aumentam, gerando denúncias de agressões

 

Política antidrogas do governo Tarcísio resulta em maior número de hospitalizações no último ano; internações involuntárias representam 5% do total

Pouco mais de um ano após a gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) mudar a política antidrogas em São Paulo, as internações involuntárias de usuários de drogas dispararam na capital.

Denúncias de agressões

Ao mesmo tempo, surgiram denúncias de agressões contra pacientes em unidades de saúde que atendem a Cracolândia, no centro da cidade.

Aumento das internações involuntárias

Até abril do ano passado, internações desse tipo eram exceções. No entanto, o governo estadual anunciou um aumento na disponibilidade de leitos psiquiátricos, em detrimento do tratamento ambulatorial, no qual as internações eram raras. Desde então, foram ao menos 418 internações involuntárias.

Dados comparativos

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Não há dados disponíveis sobre internações involuntárias anteriores a isso. Comparando junho de 2023 com o mesmo mês deste ano, os registros passaram de 11 para 31. O maior número de hospitalizações ocorreu em maio, com 58 casos notificados ao Ministério Público.

Diferença entre internações voluntárias e involuntárias

Diferente das internações voluntárias, onde o usuário assina sua admissão, as involuntárias ocorrem quando o paciente está incapaz de decidir sobre seu tratamento devido à alta intoxicação, colocando-se em risco. Nesse caso, um parente ou pessoa próxima, ou na ausência de familiares, um agente de saúde faz o pedido de internação por escrito. Em ambos os casos, é necessário um laudo assinado por um psiquiatra. Os casos devem ser informados ao Ministério Público e à Defensoria em até 72 horas, e a internação tem prazo máximo de 90 dias.

Transformação do Cratod e aumento das internações

O aumento das internações involuntárias ocorreu após a transformação do antigo Cratod (Centro de Referência de Atendimento a Tabaco, Álcool e Outras Drogas) em um pronto-socorro para tratamento de vício em drogas na capital, principalmente atendendo a Cracolândia. Agora chamado de Hub de Cuidados em Crack e outras Drogas, o espaço foi reinaugurado em abril do ano passado.

Números de atendimentos e internações

Dos 19.098 atendimentos feitos em pouco mais de um ano, 8.473 se converteram em internações em hospitais psiquiátricos, sendo 409 involuntárias, representando cerca de 5% do total. Os números são da gestão Tarcísio. Dados do Ministério Público, porém, registraram 418 hospitalizações involuntárias no mesmo período.

Governo estadual e voluntariedade dos pacientes

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O governo estadual afirmou estar à disposição dos promotores para esclarecer a diferença nos dados e declarou que a maioria dos pacientes chega ao Hub voluntariamente, “expressando o desejo de tratamento”.

Denúncias de agressões no Hub

É no novo Hub onde se concentram as denúncias de agressões. Ex-funcionários relatam ter presenciado usuários sendo arrastados, carregados pelas pernas e braços, e feridos com chutes pela equipe de segurança. Quatro ex-funcionários do Hub e duas pessoas que trabalham no atendimento municipal à Cracolândia relataram algum tipo de agressão à Folha.

Guarda Civil Metropolitana usa spray de pimenta em usuários de drogas na Rua dos Protestantes, área conhecida como Cracolândia.
Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Uso de força e ameaças

Dois ex-funcionários afirmaram que um pedaço de madeira com a palavra “internação” foi usado para ameaçar pacientes em casos de confusão. “Fizeram isso de deboche, puro deboche”, diz o psicólogo Diego William de Faria Rennó, 38, que trabalhou no Hub até março. “Já vi segurança dando chute no peito do paciente ao lado do supervisor de enfermagem”, afirma. “O mesmo supervisor de enfermagem riu com o segurança do ocorrido.”

Posicionamento do Hub

A direção do Hub negou qualquer registro ou denúncia de agressão ou espancamento. Há também reclamações contra a abordagem feita por agentes do SCP (Serviço de Cuidados Prolongados) da prefeitura. Pacientes e funcionários dizem que policiais militares acompanham essas equipes na rua.

Resposta do prefeito e da Polícia Militar

A gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) afirmou que coloca todas as opções de abordagem à disposição do paciente, conforme nota técnica. A Polícia Militar informou que, além de fazer o policiamento, sua ação na Cracolândia ocorre “em integração com outros órgãos”. Desde março, policiais militares encaminharam 69 usuários ao Hub. As ações foram incentivadas em curso ministrado a militares que atuam na região central. Segundo o governo estadual, os encaminhamentos foram voluntários.

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Conivência da direção do Hub

Ex-funcionários do Hub afirmam que a direção é conivente com as agressões. A reportagem teve acesso a uma mensagem de um coordenador orientando a não intervir em abordagens de seguranças a pacientes. “Não vamos interferir de maneira contrária nessa conduta. Isso tem gerado uma sensação de desautorização da equipe de segurança com repercussões ruins”, diz a mensagem. Ele pede que os profissionais avisem a coordenação caso identifiquem algum “manejo inadequado”. A direção do Hub afirmou que orienta profissionais de outras equipes a não interferir no manejo do paciente para “manter a integridade física” dos funcionários.

Tempo de permanência em queda

Apesar do aumento das hospitalizações, o tempo de permanência dos dependentes químicos nesses estabelecimentos nunca foi tão baixo. Segundo documento obtido pela Folha, em abril deste ano, a média de permanência de pacientes encaminhados pelo Hub em 2023 foi de 39,88 dias, “o pior nível histórico”, diz trecho de comunicado enviado ao estado pela direção do Hospital Lacan, um dos contratados.

“Atribui-se esta queda ao aumento do número de altas a pedido observado no ano de 2023, especificamente de pacientes procedentes do Hub”, diz outro trecho. A secretaria de Saúde afirmou que a média de permanência atende ao plano terapêutico oferecido no local. De acordo com Arthur Pinto Filho, promotor de Saúde Pública, o tempo médio de internação dos pacientes encaminhados pelo Hub aos hospitais psiquiátricos do estado é de 20 dias, bem abaixo dos 90 dias preconizados para completar o processo de desintoxicação. Segundo ele, isso provoca o efeito porta-giratória em que os usuários saem das internações e voltam para as ruas. Um usuário relatou ter passado por mais de dez internações em um ano. “A pessoa sai e ninguém sabe para onde”, diz o promotor.

Reações dos profissionais de saúde mental

Nas últimas semanas, profissionais de diferentes equipamentos de saúde mental se reuniram para divulgar cartas de repúdio à política estadual empregada. Relataram supostas internações forçadas e indiscriminadas na Cracolândia, além de distribuição de bebida alcoólica, comida e refrigerante para convencer usuários a aceitarem internação no SCP.

Sobre isso, a prefeitura afirmou que o SCP “oferece acolhimento e tratamento integral e multidisciplinar”. O governo estadual não comentou.

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